é o tal do ócio criativo, eu acho

sábado, 20 de outubro de 2007

Morenisse

Ela era linda. Sabe aquela morenisse que deixa o cidadão louco? Aquela morenisse jambo naturalmente da cor do pecado? Pois é, ela tinha essa morenisse. E o sorriso, então? Encantador, encantador. E o que fazer diante daquelas pintinhas que ela tinha no rosto? Mas duas coisas o deixavam sem rumo: (1) as covinhas na bochecha - e como ele adorava covinhas, na bochecha, no queixo ou aquelas duplas estrategicamente localizadas na lombar - e (2) o olhar.
O olhar daquela moça merecia um capítulo a parte. Ele tinha maldade; vejam bem, maldade no olhar toda mulher tem, ou deveria ter, mas ela era uma capituniana. E mulheres desse tipo o deixavam sem saber o que fazer, como deixam qualquer homem que não seja oblíquo e dissimulado. Era a brejeirice do olhar dela que o enfeitiçava, que o deixava sem palavras, e quando vinham, eram cuspidas sem que ele tivesse qualquer controle sobre elas. Enfim, aqueles olhinhos castanhos o faziam se portar como o idiota master ever.
Pois bem, o tempo passou e nada daqueles olhinhos castanhos nos olhos dele. A não ser em sonhos, e como costuma sonhar acordado, ele vire e mexe se via frente a frente com eles.
E não é que um dia, tchã! Ele a encontrou. Mas alguma coisa tinha mudado. Os olhos dela continuavam lá, iguaizinhos - sob um par de sobrancelhas arqueadas que os deixavam ainda mais lindos e faceiros; era foda mesmo, acreditem - só que não era mais a mesma coisa. Ele estava do lado dela e aquela vontade insana de agarrá-la e beijá-la não era mais igual à antes. Embora ele ainda pudesse ficar horas observando aquele sorriso, embora ele ainda se sentisse perdido diante da imensidão daquele olhar, tsc, tsc, não mais sentia as pernas tremerem, ele podia até dominá-las, olhem só. Definitivamente alguma coisa tinha se esvaído.
Ele formulou algumas teorias sobre isso, nada muito sólido. Uma se relacionava ao quadril dela, uma era sobre a competição com outros caras e outra era sobre a ressaca com que ele acordara naquele dia. Mas nenhuma explicava muita coisa.
Ele se perguntou por uns dias por que a vida era assim, por que o feitiço tinha acabado. Como pode aquele olhar não mais ter efeito sobre sua pobre alma? - ele pensava. Até que dia desses, ele sonhou com a voz dela, e ela tinha uma voz que também merecia um capítulo à parte. É, não dá pra fugir de uma morenisse jambo dessas.